A comunicação faz parte integral de sermos humanos. A necessidade de expressão é tão essencial como a nossa necessidade de nos movimentarmos. É uma forma de entrarmos em contacto com o outro, em darmos forma ao que é interior e que de outra maneira nunca seria posto em evidência.
Cada um de nós cresce nesse momento de expressão. Nesse instante entramos em contacto com uma parte de nós que era quieta, calada e que de repente passa a ser vida, chega ao outro e sentimos que estamos em construção de nós mesmos. Seja por palavras, sons ou ritmos, movimentos, desenhos, pinturas, esculturas, todo o meio é motivo para celebrarmos o que somos.
Como os que em cavernas pintavam, sendo por ritual ou mera exposição, sentiam a necessidade de deixar marcado o que lhes ia na alma. Nessa altura não havia lojas de materiais de arte mas isso não os deteve de se inventarem em tudo o quanto encontravam. Hoje partilho com vocês o resultado da preparação de vários materiais, desde pigmentos a utensílios para que quando estivermos submergidos em natureza, a necessidade de expressão não seja parada nunca pela falta de recursos. A preparação destes materiais é já um processo criativo por si só e podemos adaptá-los ao nosso gosto e não temos que nos restringir ao que nos é imposto pelo que existe no mercado.
Os Pigmentos
São rochas terras, plantas, liquens, fuligem... Tudo o que tinge ou deixa um rasto de cor pode ser usado para ser pigmento.
A ideia é conseguirmos pulverizar ao máximo a materia mineral ou fazer decoccões com a material vegetal para conseguirmos extrair a máxima potencialidade de cada pigmento. Nas imagens em cima (lendo-se no sentido dos ponteiros do relógio) podemos ver torrões de diferentes tons de argila, desde a tonalidade branca do caulino até aos tons mais avermelhados, com mais óxido de ferro. De seguida vemos um frasco cheio de bolota torrada e moída (a mesma usada para o café de bolota) que depois de uma decocção e redução da matéria líquida dá uma tinta castanha muito boa para a escrita. Depois temos um preto que parece carvão moído, na verdade é fuligem que é uma variedade impura do carvão. É o resultado de uma combustão incompleta do carbono, este que aqui está é o resultado da limpeza da chaminé.
Com o material mineral finamente moído podemos fazer tinta adicionando um agente aglomerante como a clara de ovo, a gelatina, pectina, a saliva ou até certas seivas de árvore que sejam mais gomosas, como acontence quanto as Mimosas - Acácia dealbata - são feridas, exudem uma goma para sua própria cicatrização, esta é muito similar à goma arábica. Com estes aglomerantes fazemos com que a tinta passe a ser fixa no suporte e não se deteriore.
Com o material vegetal em que se faz decocções para condensar a cor necessitamos de adicionar uma colher de café de sal como preservante e uma colher de chá de vinagre como mordante para cada chávena de líquido. Desta forma a tinta aguentara por muito tempo sem cheirar a putrido e fixar-se-á no papel sem uma degeneração rápida.
O Carvão
No mundo ocidental não há quem vá à escola sem um lápis de carvão mas são poucos aqueles que se saberiam desenrascar e fazer um por eles mesmos. Este carvão que aqui está foi feito com pedaços de salgueiro e queimados num processo anaeróbico dentro das latas. Quando queimamos madeira na ausência de oxigénio acontece o processo de carbonização deixando como resíduo a mesma forma original mas em forma de materiais leves e porosos. Se depois de colocarmos os paus na lata e usarmos uma fonte de calor constante como as brasas de uma fogueira podemos alcançar um resultado excelente. Este foi mantido na sua forma original mas poderá se pulverizar e usar um aglomerante para fazer carvão compressado para resultados mais uniformes. Podemos fazer lápis de carvão primitivos usando bambú ou sabugueiro como suporte. Basta termos um orificio, no caso do sabugueiro temos que escavar um bocadinho e fazer um lanho para que funcione como uma lapiseira.
Os Utensílios
Nada dá mais gosto do que usar coisas feitas por nós. A arte dita utilitária foi das primeiras formas de expressão em qualquer cultura antiga. Aqui pode-se ver (também no sentido dos ponteiros do relógio) pincéis feitos com cabos de carvalho e cauda de cavalo em duas versões: uma em que o pêlo é inserido num lanho e depois apertado com fio ou a versão em que o centro oco da pena chamado de cálamo é usado como forma de unir a madeira e o pêlo de cavalo. Também se vê um pincel que é só de madeira e a técnica é simples: roer, roer e roer. Parece fácil mas a arte de roer sem danificar a fibra da madeira tem que se lhe diga! À direita temos os lápis para pintar a tinta, estes são só madeira esculpida e devem ser mergulhados em água durante 30 minutos antes de serem usados para absorverem melhor a tinta e garantirem uma maior autonomia. Os aparos, estes feitos com bambú permitem fazer diferentes bicos e criarmos linhas distintas, muito bons no uso da caligrafia. Por último temos uma caneta de feltro artesanal que consiste em 3 peças diferentes, 2 que funcionam como pinça e a terceira que é uma cunha de madeira que garante que o feltro não se desloque enquanto o utilizamos. Esta caneta "chupa" muita tinta e por isso dá-nos uma autonomia muito mai alargada que as outras variantes.
As Linhas
Desde linhas grossas a linhas fininhas tudo o que sonharmos fazer podemos inventar e irmos adaptando às nossas necessidades. Como aqui vêem a dedicação de um pouco do nosso tempo podenos valer numa expressão ainda mais nossa e que nos surpreende pela diversidade. Espero que vos inspire a experimentar por vocês mesmos!