Chegámos ontem ao início, o ponto de onde partiu o que éramos há um mês atrás...
Saímos de Philadelphia numa lua quase escura, com vontades e energias a decompor e a tornarem-se numa força nova, que ainda não reconhecíamos como nossa. O carro que nos emprestaram virou o templo dos sonhos e tudo à volta o nosso lar. Cada sítio, um abrigo que nos acolheu como berço pré-aquecido pelo amor que os elementos nos sopravam em forma de luzes de pirilampos, frescura de riachos, ranger de árvores-avós ou o toque das nuvens através da trovoada.
Durante o percurso, tentei ao máximo deixar em papel o que os sentidos iam transbordando, como se o que já os preenchia não fosse suficiente, era preciso mais eus e por isso em palavras chegaram até aqui, até vocês.
O primeiro sítio onde estivemos foi Vernon em New Jersey, numa região muito rural onde o tractor se vê nas estradas tão frequentemente como nos caminhos minhotos. Soubemos de uma reunião de pessoas ligadas à sustentabilidade que se ia dar por lá e decidimo-nos juntar. A manhã começou com um círculo de graças e o acender do Fogo Sagrado onde muitas das pessoas anunciaram o que gostavam de partilhar nesse dia com quem estivese interessado. Meditações, Herbalismo, Música, Fertilidade, Biogás, Abelhas, foram alguns dos temas que se sentiram nos espaços de partilha ao longo do dia, por entre os campos e o arvoredo.
Fui encaminhada até uma sombra onde se falava sobre a Vida do Solo e a importância urgente deste elemento como mãe de toda a possível nutrição. Dan Kittredge, o fundador da associação chamada BioNutrient, começou a conversa por dizer que nasceu e cresceu numa quinta biológica mas que percebeu que nem este conceito vive da vida com que se nomeia. A falta de vida no solo de muitas quintas mesmo que em modo de produção biológica é uma coisa que não é falada, talvez porque nos sentimos desconfortáveis quando os selos de certificação ou informação nutricional não são suficientes para nos informarem ou talvez porque simplesmente não passa pela cabeça de muita gente...
A ingestão de nutrição, não só depende da nossa capacidade de assimilação de nutrientes mas como em tudo é preciso ir à fonte de origem dos produtos e perceber o que realmente brota dela: o que é que esta planta retira do solo para produzir folhas, flores e frutos? De que tamanho são esses frutos? E o sabor, o cheiro? Esquecemo-nos do quanto ainda somos seres activos nesta escolha, e que os nossos sentidos nos trazem uma realidade bem mais definida do que as palavras que embrulham um produto.
O trabalho da BioNutrient é este, o de empoderar as pessoas na produção e consumo de alimentos de qualidade nutritiva, que provêm de solos vivos, recheados de matéria orgânica, minerais, água e ar.
Como produtores temos que dar ao solo o que ele precisa para que as plantas tenham acesso a uma troca de açúcares mais produtiva com organismos como bactérias e fungos que em retorno darão acesso a minerais e a para a planta um sistema imunitário forte que consiga produzir a sua capacidade real, que na verdade é muito mais elevada do que estamos habituados a ver. A ideia é usarmos pós de minérios em diferentes alturas do ano, muita cobertura de solo - até meio metro de altura - porque a Mãe Terra não gosta de andar nua e fazer com que a água se infiltre no solo em vez de corroer a Terra e levar os seus minerais consigo.
Como consumidores temos os nossos sentidos e ferramentas como os nossos narizes, o nosso paladar, e a nossa capacidade de avaliar qualidade como seres multi-sensoriais.
"Hmm este morango sabe aos morangos de antigamente!" Este antigamente eram solos mais carregados de vida dos que o de hoje. Não só porque não eram usados produtos que desgastam o solo mas principalmente porque este era tido ainda como elemento principal, a estrela da produção.
Para os que ainda estão no processo de aprender a confiar em si mesmos existe um pequeno aparelho bastante acessível chamado refractómetro que, após a inserção de sumo das plantas nos indica a quantidade de açúcares que a planta produz. Uma planta feliz e saudável produz uma quantidade elevada de açúcares que, como disse antes, são dados aos organismos que habitam o solo par apoderem aceder à nutrição que necessitam, e quanto mais açúcares conseguimos detectar mesmo depois dessa troca maiores são as possíbilidades dessa planta ter conseguido um grande número de minerais e micro-nutrientes. Se pensarmos numa planta que não consegue aceder a essa nutrição, num solo sem vida o que acontece é que ela irá continuar a distribuir os açúcares mas não irá ter grande resposta do outro lado por isso quase esgota a sua reserva de açúcar e por consequência a sua energia.
Imagem de um refráctometro óptico
Este aparelho simples é bastante frequente em Portugal, principalmente usado pelos produtores de vinho que precisam de certificar-se da quantidade de açúcares na produção que se irá converter em álcool mais tarde. Ajuda-os a saber quando é a altura certa para colher as uvas, quando elas estão no pico de maturação.
Para nós foi fascinante ouvir o Dan falar, com toda a sua paixão por esta Terra que nos sustenta e perceber que quanto mais unidos nesta partilha de assuntos tão importantes, mais saúdaveis seremos.
Quanto mais vida no solo temos, mais vida em nós tranportaremos.
Vale a pena darem uma vista de olhos no site da BioNutrient, eles costumam organizar uma conferência sobre solo e nutrição todos os anos e partilham com quem estiver interessado os documentos em formato aúdio, vídeo ou pdf.
Aqui fica o link: http://bionutrient.org/